Longevidade demanda um design diferente da sociedade contemporânea
Na coluna passada, fiz uma provocação bem-humorada sobre ninguém estar velho demais para fazer uma série de coisas em 2020. Brincadeiras à parte, esse é o objeto de reflexão de um número crescente de especialistas. O Centro de Longevidade da Universidade de Stanford, nos EUA, quer criar o que batizou de “novo mapa da vida”, que funcionaria como uma espécie de bússola para aprendermos a navegar nesses mares ainda desconhecidos. E por quê? Porque a perspectiva de chegarmos aos 90 ou 100 anos gera um desafio: o que vamos fazer com nossa existência superestendida?
A iniciativa consiste num projeto de cinco anos, até 2023, para pesquisar e definir novos modelos de educação e aprendizado contínuo; redesenhar a forma como trabalhamos; propor políticas públicas para saúde, moradia, segurança financeira; além de promover ações que estimulem a convivência entre diferentes gerações. Na verdade, o diagnóstico é de que teremos que criar uma outra narrativa sobre a velhice, uma vez que a tradicional já não representa a realidade. Há grupos nas áreas de saúde, trabalho, educação, finanças, meio ambiente, influências sociais e a chamada “early life”, ou seja, o início da infância. O movimento quer aumentar a consciência sobre o impacto dessas mudanças nos próximos anos, para que a sociedade se mobilize.
Laura Carstensen, diretora do centro de longevidade da Universidade de Stanford, na Califórnia — Foto: Divulgação
1) Desafio urgente: a população mundial é de 7.6 bilhões. Chegará a 8.6 bi em 2030 e 9.8 bilhões em 2050. O curso de vida das pessoas deverá comportar mais de uma carreira e períodos de estudo e transição para diferentes atividades.
2) Intergeracionalidade: será preciso superar a segregação entre gerações que ainda perdura. A convivência em casa, no trabalho e em ambientes de estudo será um fator primordial para o bem-estar de todos.
3) Desigualdades econômicas, educacionais e raciais deverão ser combatidas para que a longevidade não se restrinja aos privilegiados.
4) O uso da tecnologia: como inserir as pessoas para que todos se beneficiem de seus aspectos positivos e se conscientizem dos negativos.
5) Foco na infância: a saúde está intimamente relacionada aos estágios iniciais da vida. Se as crianças vão viver mais de 100 anos, o conceito de educação terá que mudar. O modelo atual, que encerra a formação do profissional na universidade, precisa ser revisto, para o desenvolvimento de habilidades como criatividade, flexibilidade e resiliência.
6) Saúde: o foco deverá ser na prevenção, para que todos permaneçam saudáveis durante o maior tempo possível. Isso inclui combater a obesidade (infantil inclusive), fumo e o uso de opioides.
7) Trabalho: o emprego para a vida toda acabou e os trabalhadores terão que ser treinados continuamente. Já é possível imaginar um cenário no qual uma pessoa na casa dos 30 anos sai do mercado por uma década para cuidar dos filhos e depois se dedica a uma nova carreira, sendo comum ter colegas de 70 e 80 anos.
9) Meio ambiente: aqui a expressão se refere às cidades, que precisarão investir em sistemas integrados de transporte e moradia acessível. Um modelo que vem angariando adeptos prevê assistência para os idosos sem que tenham que se mudar para uma instituição, inclusive convivendo com jovens que se encarregariam de alguns serviços.
10) Influências sociais: independentemente da idade, todo indivíduo necessita do senso de pertencimento, de um propósito. A saída: coordenar ações para que os muitos anos que as pessoas terão pela frente ganhem significado.
Fico feliz que o blog discuta esses temas. Nossa jornada continuará ano que vem. Um ótimo 2020!
Jornalista, mestre em comunicação pela UFRJ e professora da PUC-RIO, Mariza escreve sobre como buscar uma maturidade prazerosa e cheia de vitalidade.
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