“Vivemos no limiar de uma crise sem precedentes, principalmente no que tange a doenças crônicas como hipertensão e diabetes”, diz especialista
Há cerca de duas semanas, a Universidade de São Paulo (USP) realizou seu 2º. Simpósio sobre Envelhecimento Ativo, num encontro que reuniu centenas de participantes tão engajados quanto preocupados com a dimensão dos desafios que o Brasil tem pela frente. À frente da iniciativa estava o médico Egidio Dórea, um apaixonado pela causa da longevidade. Doutor em nefrologia, é coordenador do programa Universidade Aberta da Terceira Idade, da USP; professor na Universidade Municipal de São Caetano do Sul; além de responsável pelo Programa de Envelhecimento Ativo da USP, que é voltado para os funcionários da instituição e existe desde 2015.
Ao longo do evento, os especialistas passaram em revista os quatro pilares que sustentam uma velhice de qualidade: saúde, segurança, participação (social) e aprendizagem contínua. Sobre a questão da saúde, o dr. Egidio Dórea diz que, apesar de o país ter políticas públicas voltadas para os idosos, elas não são postas em prática. “Vivemos no limiar de uma crise sem precedentes, principalmente no que tange a doenças crônicas não transmissíveis, como hipertensão e diabetes, que estão relacionadas ao desenvolvimento de demências. Somente com a adoção de hábitos de vida saudáveis conseguiremos uma redução significativa dessas doenças”, analisa. Um bom exemplo disso é sua prática no ambulatório de clínica médica do Hospital Universitário da USP, onde atende a pacientes com doença renal crônica pré-diálise – a maioria deles sofrendo de hipertensão e diabetes.
Avalia que o quadro também é sombrio no que diz respeito aos cuidados paliativos, que abrangem tudo o que pode ser oferecido, a quem tenha uma doença fora de possibilidade de cura, para garantir qualidade de vida até o fim. Por enquanto, a área não é reconhecida como especialidade: “isso agrava a desigualdade entre os idosos. Somente quem dispõe de recursos tem acesso a tratamentos diferenciados”. No que tange ao pilar da segurança, que envolve a falta de oportunidades para os mais velhos no mercado de trabalho, afirma: “ainda estamos na fase do discurso sobre os aspectos positivos da diversidade, mas na prática é muito baixa a participação do idoso. O empregador não se convenceu das vantagens de ter empregados maduros e acaba descartando um rico capital humano”. No entanto, faz uma ressalva: “a pessoa mais velha também deve entender a importância de se adaptar e dominar novas habilidades”. O professor aponta que os benefícios da tecnologia, em termos de inserção e aprendizado, poderão se tornar inacessíveis para os indivíduos de baixa renda.
A desigualdade embute o risco de comprometer o bônus da longevidade, porque não vai dar voz aos que estão em situação mais frágil. “O preconceito contra o velho é grande e precisamos de uma ampla mobilização, que inclua os jovens, para combater o ageísmo. Assistimos a uma valorização apenas do idoso ainda vigoroso, que acaba levando ao repúdio de quem é mais velho e frágil”, ressalta, acrescentando que há um manto de silêncio em relação aos direitos LGBT: “essa é uma minoria que conseguiu se expressar nas últimas décadas, mas descobre que, ao envelhecer e precisar viver numa instituição, tem que voltar para o armário e perder sua identidade sexual”. Dórea, que se especializou em prevenção de quedas na faculdade de medicina de Yale, nos EUA, implantou esse programa em 600 praças em São Paulo e enfatiza a necessidade de o envelhecimento ganhar mais espaço no currículo dos estudantes de medicina: “mais de 60% dos pacientes no hospital universitário são idosos. Não há geriatras para todos, os médicos terão cada vez mais que estudar o envelhecimento e as principais morbidades”.
G1 Por Mariza Tavares, Rio de Janeiro
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