Estudos mostram que a pandemia de covid-19 vem colocando à prova nossa saúde mental e deixando mais pessoas deprimidas.
Nossa saúde mental tem sido colocada à prova pela pandemia de covid-19 — Foto: Getty Images via BBC
A pandemia de covid-19 tem posto em risco não só a saúde física, mas mental da população. O isolamento imposto pelas medidas para conter a propagação da doença, a crise econômica, o desemprego e a própria ansiedade em relação à contaminação são alguns fatores que colocam à prova nosso bem-estar psicológico.
Não é à toa que estudos mostram um aumento nos índices de depressão, doença que atinge mais de 320 milhões de pessoas no mundo, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).
A depressão que impacta a maioria dos pacientes é a unipolar, também conhecida como transtorno depressivo maior. A causa mais comum é de cunho genético, mas também pode ser provocada por perdas, estresse e até problemas neurológicos.
Mas existem classes diferentes de depressão. De acordo com a psiquiatra Ana Paula Carvalho, coordenadora da Liga de Depressão do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), há três tipos menos conhecidos e comuns na população: depressão psicótica, distima e bipolar.
“No caso dessas doenças, muitas vezes o diagnóstico deixa de ser feito pelo próprio psiquiatra ao longo dos anos, passando despercebido e sem uma avaliação criteriosa. Na depressão bipolar, por exemplo, a descoberta pode levar mais de dez anos, dificultando o tratamento”, diz a psiquiatra.
Depressão bipolar: a mais difícil de ser identificada
O transtorno bipolar do tipo 1 é a forma mais clássica e é caracterizado pela euforia (mania e hipomania). Já o do tipo 2, que é a depressão bipolar, o paciente apresenta quadros de tristeza e hipomania — estado mais leve de euforia, otimismo e, às vezes, agressividade.
“Geralmente, quando ocorre somente a bipolaridade é mais fácil de reconhecer a doença, já que o paciente apresenta sintomas evidentes. Porém, quando o quadro depressivo aparece em conjunto, pode levar anos até chegar a um diagnóstico preciso”, afirma Luiz Dickeman, psiquiatra da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
O especialista explica que, para o paciente ser caracterizado com a condição, ele precisa ter episódios de hipomania pelo menos uma vez ao longo da vida, durante quatro dias ou mais.
“Ele deve ser expor a atividades de risco como gastos excessivos, vontade exacerbada de fazer sexo, pouca horas de sono.”
Um estudo publicado na revista Brasileira de Psiquiatria mostrou que, em média, leva-se oito anos para diagnosticar um paciente com depressão bipolar.
A causa mais comum da depressão é de cunho genético — Foto: Getty Images via BBC
Outras publicações americanas já mostraram que o diagnóstico pode demorar até 15 anos.
Fabiano Alves Gomes, psiquiatra e professor da Queen’s University, no Canadá, explica que, enquanto a prevalência da depressão unipolar é de aproximadamente 15%, as formas mais clássicas do transtorno bipolar (tipo 1 e tipo 2) têm prevalência em cerca de 3% da população.
Neste tipo, o tratamento mais indicado não é com antidepressivos, e sim, com estabilizadores de humor. “É possível atingir recuperação completa principalmente se tratada adequadamente e no início”, afirma Gomes.
Distimia: menos conhecida entre os próprios pacientes
O transtorno depressivo persistente ou distimia é uma depressão crônica, caracterizada por sintomas que duram por até dois anos ou mais. A causa ainda é pouco conhecida pelos médicos, mas os especialistas acreditam que seja multifatorial.
Ela é menos comum, e o próprio paciente pode não reconhecê-la por achar que os sinais estão relacionados à personalidade.
“É a típica pessoa que reclama toda hora, que tem uma visão pessimista das coisas e vive em uma rotina de lamentações. O que dificulta o diagnóstico é que na grande maioria dos casos, familiares e amigos acham que é o ‘jeito’ dela e que vai passar com a idade”, afirma Carvalho.
No entanto, os sintomas podem evoluir para uma depressão mais grave. “O paciente demora a procurar ajuda porque acredita que não é nada e o quadro depressivo só piora.
“Às vezes, permanece com o problema por 20 anos, até ir ao médico. O distêmico está abaixo da linha da normalidade”, reforça a especialista.
“É uma pessoa funcional, que come, dorme, consegue trabalhar. O grande problema é que a doença provoca um impacto bem grande na qualidade de vida, já que o indivíduo reclama o tempo todo, está sempre de mau humor e sofre com baixa autoestima”, diz Dickeman.
O tratamento mais indicado é a combinação de medicamentos em doses geralmente mais altas do que os da depressão unipolar, além de psicoterapia.
Depressão psicótica: a forma mais grave do transtorno
Além de tristeza, o paciente sempre apresenta sintomas psicóticos como alucinações e delírios. “É uma alteração dos cinco sentidos. Você pode ouvir e ver coisas, sentir cheiros e até toques na pele”, explica Dickeman.
Considerada rara pelos médicos, a depressão do tipo psicótica é provocada por luto, traumas ou cobrança excessiva em relação a si mesmo.
Segundo o psiquiatra da Unifesp, ela é mais fácil de diagnosticar, já que os sintomas são percebidos nos primeiros atendimentos. Porém, o que acontece muitas vezes, é que a doença causa um desgaste familiar muito grande, e o paciente fica fora de si com frequência.
A depressão também pode ser provocada por perdas, estresse e até problemas neurológicos — Foto: Getty Images via BBC
Neste quadro depressivo, as chances de reações suicidas são maiores e, por isso, familiares devem ficar atentos. É necessário ter um acompanhamento médico frequente até a melhora dos sintomas.
“É fundamental distinguir os vários tipos de depressão, pois o tratamento é diferente. A depressão psicótica exige associação de antipsicóticos. Todas podem ser feitas com técnicas de estimulação magnética e eletroconvulsoterapia que proporcionam bons resultados. Caso não sejam tratados, os pacientes permanecem deprimidos e além dos sofrimentos psíquicos apresentam perda de funcionalidade, dificuldades cognitivas, adoecimento fisico e risco de suicídio”, diz Fabiano Alves Gomes.
G1 Bem Estar por BBC